quarta-feira, 19 de maio de 2010

ESTOU LIBERTO E PERDIDO



Todos os problemas são insolúveis. A essência de haver
um problema é não haver uma solução. Procurar um fato
significa não haver um fato. Pensar é não saber existir.

Nunca tive alguém a quem pudesse chamar "Mestre",
Não morreu por mim nenhum Cristo. Nenhum Buda me
indicou um caminho. No alto dos meus sonhos nenhum
Apoio ou Atena me apareceram, para que me iluminassem a
alma.

O tempo! O passado! [...] Aquilo que fui e nunca mais
serei! Aquilo que tive, e não tornarei a ter! Os Mortos! Os
mortos que me amaram na minha infância. Quando os evoco
toda a alma me esfria e eu sinto-me desterrado de corações,
sozinho na noite de mim-próprio, o como um mendigo
o silêncio fechado de todas as portas.

Nunca encarei o suicídio como uma solução, porque eu
odeio a vida por amor a ela. Levei tempo a convencer-me
deste lamentável equívoco em que vivo comigo. Convencido
dele, fiquei desgostoso, o que sempre me acontece quando
me convenço de qualquer coisa, porque o convencimento é
em mim sempre a perda de uma ilusão.



Embora eu esteja cansada de não ser ninguém
Embora eu esteja errada, tudo bem
Se acordo e viro pro lado, e o vazio reinando em seu lugar
Abraço o vento e dou risadas pro ar

Ir embora nem sempre é bom, melhor evitar
Aquela história onde tudo começou vai desmoronar
É difícil ficar acordado quando o violão quer ser tocado
Confie no seu taco, fim de papo, deixa o clima rolar

Refrão
Então cuide de você
Esqueça aquilo tudo que sentiu, pois isso não vale nada
O tempo é teu amigo, mas te engole feito alma penada
E o cara que se diz seu amigo só te põe em cilada
Não vacile, não
Não vacile..

Não ando muito bem, mas esta música me anima, cada vez que eu ouço... e me faz esquecer da realidade diante de meus olhos, que não me deixam pensar em paz.




segunda-feira, 17 de maio de 2010

Sou um estrangeiro neste mundo.



Sou um estrangeiro, e há na vida do estrangeiro uma solidão pesada e um isolamento doloroso. Sou assim levado a pensar sempre numa pátria encantada que não conheço, e a sonhar com os sortilégios de uma terra longínqua que nunca visitei.

Sou um estrangeiro para minha alma. Quando minha língua fala, meu ouvido estranha-lhe a voz. Quando meu Eu interior ri ou chora, ou se entusiasma, ou treme, meu outro Eu estranha o que ouve e vê, e minha alma interroga minha alma. Mas permaneço desconhecido e oculto, velado pelo nevoeiro, envolto no silêncio.

Sou um estrangeiro para o meu corpo. Todas as vezes que me olho num espelho, vejo no meu rosto algo que minha alma não sente, e percebo nos meus olhos algo que minhas profundezas não reconhecem.

Quando caminho nas ruas da cidade, os meninos me seguem gritando: “Eis o cego, demos-lhe um cajado que o ajude.” Fujo deles. Mas encontro outro grupo de moças que me seguram pelas abas da roupa, dizendo: “É surdo como a pedra. Enchamos seus ouvidos com canções de amor e desejo.” Deixo-as correndo. Depois, encontro um grupo de homens que me cercam, dizendo: “É mudo como um túmulo, vamos endireitar-lhe a língua.” Fujo deles com medo. E encontro um grupo de anciãos que apontam para mim com dedos trêmulos, dizendo: “É um louco que perdeu a razão ao freqüentar as fadas e os feiticeiros.”

Sou um estrangeiro neste mundo.

Sou um estrangeiro e já percorri o mundo do Oriente ao Ocidente sem encontrar minha terra natal, nem quem me conheça ou se lembre de mim.

Acordo pela manhã, e acho-me prisioneiro num antro escuro, freqüentado por cobras e insetos. Se sair à luz, a sombra de meu corpo me segue, e as sombras de minha alma me precedem, levando-me aonde não sei, oferecendo-me coisas de que não preciso, procurando algo que não entendo. E quando chega a noite, volto para a casa e deito-me numa cama feita de plumas de avestruz e de espinhos dos campos.

Idéias estranhas atormentam minha mente, e inclinações diversas, perturbadoras, alegres, dolorosas, agradáveis. À meia-noite, assaltam-me fantasmas de tempos idos. E almas de nações esquecidas me fitam. Interrogo-as, recebendo por toda resposta um sorriso. Quando procuro segura-las, fogem de mim e desvanecem-se como fumaça.

Sou um estrangeiro neste mundo.

Sou um estrangeiro e não há no mundo quem conheça uma única palavra do idioma de minha alma...

Caminho na selva inabitada e vejo os rios correrem e subirem do fundo dos vales ao cume das montanhas. E vejo as árvores desnudas se cobrirem de folhas num só minuto. Depois, suas ramas caem no chão e se transformam em cobras pintalgadas.

E as aves do céu voam, pousam, cantam, gorgeiam e depois param, abrem as asas e viram mulheres nuas, de cabelos soltos e pescoços esticados. E olham para mim com paixão e sorriem com sensualidade. E estendem suas mãos brancas e perfumadas. Mas, de repente, estremecem e somem como nuvens, deixando o eco de risos irônicos.

Sou um estrangeiro neste mundo.

Sou um poeta que põe em prosa o que a vida põe em versos, e em versos o que a vida põe em prosa. Por isto, permanecerei um estrangeiro até que a morte me rapte e me leve para minha pátria.

Khalil Gibran

segunda-feira, 10 de maio de 2010

ISMÁLIA



Alphonsus de Guimaraens

Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...



quinta-feira, 6 de maio de 2010

Tudo o que É Sólido Pode Derreter...


Tu que ja foste a rainha do Nilo

A imperatriz do nailon
A duquesa da beleza
A sufragista luz acessa
Na caverna iluminista


Tu que já posaste para capa de revista
E guerreaste ativista
Lider sindicalista
Que já te provaste ensaista
Contista, romancista
Roqueira, feiticeira
Tu que ja foste a primeira
A síntese de uma especie inteira
Que fazes agora
Nessa banheira?

Tu
Rainha do Nilo
Duquesa da beleza
Luz acessa
Caverna iluminista
Tu que já posaste para capa de revista
Lider sindicalista
Que já te provaste ensaista
Roqueira, feiticeira
Tu que ja foste a primeira,
A síntese de uma especie inteira
Que fazes agora?

Tu
Rainha do Nilo
Duquesa da beleza
Luz acessa
Caverna iluminista
Tu
Capa de revista
Lider sindicalista
Contista, romancista
Tu que ja foste a primeira,
E inteira
Agora
Banheira

segunda-feira, 3 de maio de 2010

O LIVRO DO DESASSOSSEGO



A manhã do campo existe;
A manhã da cidade promete.
Uma faz viver; a outra faz pensar.
E eu hei sempre de sentir, como os grandes malditos,
Que mais vale pensar que viver...

Tanta inconseqüência em querer bastar-me!
Tanta consciência sarcástica das sensações justapostas!
Tanto enredo da alma com as sensações, dos pensamentos com o ar e o rio,
para dizer que me dói a vida no olfato e na consciência,
para não saber dizer, como na frase simples e ampla do Livro
de Jó,''Minha alma está cansada de minha vida!''.

Ah, quem me salvará de existir?
Não é a morte que quero, nem a vida:
É aquela outra coisa que brilha no fundo da ânsia
como um diamante possível numa cova a que se não se pode descer.
É todo o peso e toda a mágoa deste universo real
e impossível, deste céu estandarte de um exército incógnito,
destes tons que vão empalidecendo pelo ar fictício, de onde o
crescente imaginário da lua emerge numa brancura elétrica
parada, recortado a longínquo e a insensível.
É toda a falta de um Deus verdadeiro que é o cadáver
vácuo do céu alto e da alma fechada. Cárcere infinito — porque
és infinito, não se pode fugir de ti!

Não é o tédio a doençpa do aborrecimento de nada ter que fazer, mas a doença maior de se sentir que não vale a pena fazer nada....